terça-feira, 1 de dezembro de 2015

28 de Novembro em Ainaro

Desta vez foi só meio barquinho cruzador que navegou até ao município de Ainaro, bem no centro do território de Timor-Leste, através de montanhas, curvas e muita poeira. Já tinhamos ambos percorrido tais caminhos quando fomos ao Ramelau em Novembro do ano passado. Mas desta vez não fui para aquelas bandas para me aventurar no trekking. O que me levou lá desta vez?

Acontece que no dia 28 de Novembro de 1975, na senda da descolonização que se seguiu ao 25 de Abril e na iminência de uma ocupação por parte da Indonésia, os líderes do povo timorense proclamaram a independência do território que era, até então, colónia ultramarina de Portugal. Infelizmente essa proclamação não foi suficiente para que a suspeita temida não se viesse a confirmar: no dia 7 de Dezembro de 1975 os exércitos indonésios invadiram o território de forma ilegítima e ocuparam-no durante 24 anos. 

Em 2015 celebram-se também os 500 anos do primeiro contacto entre as civilizações portuguesa e timorense. Assim, neste dia 28 de Novembro de 2015 comemoraram-se oficialmente as duas efémerides: os 40 anos da proclamação da independência e os 500 anos do primeiro contacto com o povo português.

As  comemorações principais aconteceram no enclave de Oe-cusse, um pedaço de território que pertence a Timor-Leste mas que está localizado na parte ocidental da ilha. Em Oe-cusse marcaram presença representantes de Portugal, a saber, o Tony Carreira e o Dom Duarte de Bragança... Têm-se ouvido protestos e lamentações pelo facto de Portugal não ter enviado um representante governativo mais distinto para participar nestas comemorações. Parecem-me legítimos tais protestos. Para a ausência de um alto representante muito contribuíram as recentes patetices dos partidos e das gentes que nos (des)governam.

A Oe-cusse não fui. Mas em todas as capitais de municípios realizaram-se cerimónias comemorativas ainda que mais modestas. Então calhou-me em sorte assistir à comemoração no município de Ainaro.

Ainaro é uma vila agradável situada num vale rodeado das mais altas montanhas de Timor-Leste, incluído o afamado Ramelau. Também Maubisse, vila do mesmo município onde dormimos e visitámos algumas escolas, fica no seu vale. Ambas têm um clima mais temperado do que Díli e, por isso, nelas podemos encontrar árvores e plantas pouco frequentes nestas paragens. Dali nos chegam os poucos pêssegos, nesperas e morangos que esta terra produz.

É uma zona onde abunda também o café! A par com Ermera, Ainaro é o município em que as plantações de café estão um pouco mais modernizadas e industrializadas, embora ainda haja muito trabalho a fazer nessa área. Em Ainaro pernoitámos em casa do sr. Cesário e em Maubisse na guesthouse do sr. Diogo. Gente muito hospitaleira e gentil! Warm people


Eis algumas imagens para dar cor ao relato:

Banner relativo às comemorações do dia 28 de Novembro

Parada: os alunos das várias escolas do município com as respetivas fardas, a população local e a marcha formal certamente muito treinada como tudo o que diz respeito ao protocolo. Nos aspetos formais as cerimónias aqui são impecáveis, nada falha!




Timor-Leste é um país jovem e as autoridades têm feito um esforço de consolidação do patriotismo e afirmação da identidade timorense. Isso explica que a bandeira e o hino tenham aqui um significado e um peso que já há muito perderam em alguns países ocidentais. Na primeira segunda-feira de cada mês em todas as sedes das instituições públicas (e também algumas privadas) é hasteada a bandeira enquanto se canta: “Pátria! Pátria! Timor-Leste é a nossa nação! Glória ao povo e aos heróis da nossa libertação!” Já foram mais as vezes que cantei o hino de Timor-Leste em cerca de um ano do que aquelas que cantei o hino de Portugal em toda a minha vida...

Coro formado por alunos das escolas secundárias

O Vice-Ministro da Educação introduz um minuto de silêncio em memória dos heróis e das vítimas.

O Secretário de Estado das Terras e Propriedades leu para a população local o mesmo discurso que o Presidente da República Taur Matan Ruak proferiu neste dia em Oe-cusse.



A sul da vila de Ainaro fica este local tristemente célebre que recebeu o nome de Jakarta Dua (significa Jakarta Dois). Quando os militares indonésios capturavam elementos da resistência ou da guerrilha nesta zona do país diziam às famílias que os iam enviar para Jakarta onde teriam condições e segurança. Sabe-se, no entanto, que o destino de muitos deles era outro: de mãos e pés atados eram empurrados deste precipício com mais de 100 metros de altura (a fotografia não deixa perceber bem a altura do precipício porque não tive coragem de me aproximar mais).

Monumento do tempo colonial de homenagem a Dom Aleixo Corte-Real, régulo timorense que durante a II Guerra Mundial recusou render-se aos japoneses acabando por ser por eles fuzilado. Os nossos livros de história pecam ao afirmar que Portugal não participou na II Guerra Mundial: parece certo que não havia, na época, grande consideração pela colónia do sudeste asiático mas, fosse como fosse, Timor-Leste era território ultramarino português, palco de conflitos entre forças australianas e japonesas, zona considerada estratégica. A população local sofreu a dureza da guerra.


Depois das comemorações viajámos até Maubisse onde já chegámos de noite:


A Igreja de Maubisse à noite.

A Igreja de Maubisse no dia seguinte de manhã.



Simpática guesthouse!

 Esta é a foto da praxe para os pais não poderem dizer que nunca apareço!

De Maubisse merece também destaque a visita à Escola Verde, um projeto de educação ambiental muito muito interessante! Fica prometido para um outro post!...




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