quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

Lágrimas e Sorrisos na Despedida

Lembro-me do dia 2 de Outubro de 2014 e das lágrimas que rolavam cara abaixo quando, de mãos dadas, percorríamos os corredores do aeroporto de Lisboa em direção ao ponto de controlo de segurança, já depois de termos entrado na zona exclusiva para passageiros e termos dado o último adeus à família e aos amigos que se despediram de nós no aeroporto.

Tínhamos desejado e sonhado viver uma temporada em Timor-Leste e, agora, o desejo estava a materializar-se. Ao mesmo tempo, adensava-se a consciência da distância à família e à vida que tínhamos conhecido até então. Naqueles corredores do aeroporto, o nosso coração fez-se muito pequenino, pressionado pela ansiedade e pela incerteza, à medida em que avançávamos em direção ao desconhecido.

Agora, passados três anos e mais quase três meses, chega ao fim a nossa temporada timorense. E tal como aconteceu na viagem que primeiro aqui nos trouxe, também agora são as lágrimas que pautam os vários momentos de despedida que nos são oferecidos. Porque também agora surge a consciência de que, mais uma vez, deixaremos para trás família. Sim, aqui conhecemos mauns e manas que se tornaram irmãos e irmãs.

Ao longo destes três anos deparámo-nos com muitas situações que provocaram mais lágrimas. Frustrações, injustiças, histórias comoventes de sofrimento e resiliência... Por vezes chorar foi a forma encontrada para conseguirmos encaixar a realidade e trazê-la connosco no coração. Naquele coração que se fez pequenino nos corredores do aeroporto de Lisboa, mas que depois teve de se alargar e esticar (às vezes com dor) para que lá coubesse tudo aquilo que aqui vivemos.

E mesmo que a emoção leve a melhor e sejam as lágrimas a marcar alguns momentos aqui passados, e também a entrada e a saída neste país do sol nascente, são muito mais os sorrisos que vão perdurar na memória. Os sorrisos quentes, hospitaleiros e francos dos amigos timorenses.

Dizia-me a Débora recentemente que Timor me fez sorrir de forma diferente, mais aberta, mais escancarada. Que talvez Timor tenha provocado algumas benditas brechas na minha natureza tímida e fechada. Não me tinha apercebido de tal fenómeno até ela o identificar. E, mesmo não estando ainda certo de que ela tenha razão, oro para que assim seja! Que de Timor eu leve as emoções, um coração alargado e, se necessário, uma ou outra lágrima. Mas que leve também comigo essa boa disponibilidade para ser mais caloroso, mais pronto a abraçar o próximo, mais corajoso na hora de sorrir diante do desconhecido.

segunda-feira, 6 de março de 2017

Fim de Semana na Paz de Laclubar

Díli é uma cidade muito barulhenta e essa é uma das realidades mais surpreendentes com que nos deparámos aqui. Surpreendente porque uma pessoa, antes de cá aterrar, imaginava-a bucólica, lenta e tranquila, como se se tratasse de um oásis neste mundo tão acelerado e ruidoso.

Assim, sair de Díli é não só aceder a um outro Timor, talvez mais rústico e genuíno e também mais pobre e mais distante de tudo aquilo que consideramos os serviços básicos no mundo desenvolvido (saúde, eletricidade, saneamento, etc), mas é também aceder a regiões onde ainda reina uma saudável e contrastante tranquilidade.




A visita a Laclubar já tinha sido planeada em meados do ano passado, pouco depois de termos tido conhecimento da existência da Hospedaria São João de Deus. Mas quando, em Maio de 2016, tentámos reservar quarto na Hospedaria já ela estava esgotada para o fim de semana grande em que se celebrou o aniversário da restauração da independência de Timor-Leste. Tivemos então de optar por uma ida até Com, na ponta leste do país.

Desta vez reservámos quarto com mais antecedência se bem que isso até teria sido dispensável tendo em conta que, talvez por causa das chuvas, só nos cruzámos com mais dois hóspedes. De qualquer forma, fizemos a nossa reserva assim que soubemos que seria feriado na sexta-feira 3 de Março, cheios de vontade de experimentar a paz e o clima mais frio de Laclubar.

Não ficámos desiludidos! Em Laclubar encontrámos a Hospedaria São João de Deus que é muito mais do que uma hospedaria. Na verdade, o principal trabalho que a Ordem Hospitaleira de São João de Deus ali é a gestão de uma Casa de Saúde dedicada à recuperação de pacientes com problemas psicológicos e mentais. O frade português responsável pela coordenação das atividades de saúde e também o responsável pela gestão da hospedaria que funciona, duplamente, como uma forma de angariar receitas para a Casa de Saúde e como um espaço que visa proporcionar retiro e descanso aos hóspedes, atraindo sobretudo estrangeiros residentes em Díli.

E, de facto, retiro e descanso foi o que ali desfrutámos. Connosco levámos livros de Henri Nouwen e Sarah Withrow King, no caso da Débora, e de Julian Barnes e Amy Chua, no caso do David. Houve tempo para passear nas redondezas admirando a paisagem dominada pelas montanhas e pelo nevoeiro e houve tempo para meditar e para partilhar pensamentos com o papel e um com o outro.

O espaço é muito bonito, com construções em madeira e canteiros de flores bem cuidados. A parte reservada para a hospedaria é um edifício em madeira com uma espécie de pátio interior a fazer lembrar os claustros monásticos. Está tudo muito bem equipado e nem os constrangimentos elétricos (ainda frequentes e quase ininterruptos nas últimas duas semanas conforme nos explicou o sr. frade) foram motivo de perturbação. De qualquer forma não tínhamos levado equipamentos elétricos e as leituras podiam fazer-se no pátio sob a luz natural esbranquiçada por via de um sol escondido atrás do nevoeiro.






O duche fez-se de água tépida, improvisado e à maneira indonésia, com gayon, porque as casas de banho estão muito bem equipadas mas o sistema de aquecimento não recebeu energia suficiente para funcionar. Mas isso também fez parte da boa aventura.

Foi um fim de semana de pura tranquilidade e regressámos a Díli com o desejo de voltar a visitar Laclubar caso surja uma boa oportunidade. Nem o percurso acidentado nos demove! E se ele é acidentado!... Vejam lá no vídeo abaixo: